quarta-feira, 14 de setembro de 2011


“Twilight Zone” Numa Casa De Putas



Como quando se passa mil vezes ao lado de uma casa e se entra pela primeira vez,

Entrar no café onde se conquistaram as primeiras emigrantes francesas tardiamente,

Com o fascínio das mamas nas mãos e cheias da saliva apressada, incrédula, o piercing

A enrolar a língua, a amiga no aniversário a chupar depois da boca doce com o seu bolo

De aniversário, entrar no café onde se cresceu para os prazeres da vida, mesmo que

Alguns ridículos e ser a primeira vez, uma entrada num buraco de verme e estar no Brasil,

Luzes vermelhas quase inúteis com o vizinho com quem se construiu casas de árvores nos

Pinheirais que hoje queimados, pagar o triplo por uma cerveja que já trazemos dentro

E até os sofás parecem diferentes, mesmo conhecendo a leveza do meu cu de outros tempos.

Na loja mais abaixo, onde eu e o meu melhor amigo de infância comprávamos brinquedos

Esquecidos de outros tempos a preço antigo e mais sobrava para as batatas fritas

E as latas de refrigerante para levar até às fragas onde impérios dentro de nós

E agora uma foca à porta a trabalhar à hora por rata, loiras só por cima e em baixo

Nada porque é mais higiénico, enquanto se aproximam como hienas com o cheiro

Do último trolha disfarçado com perfume barato, chamam-me Elvis, convencidas

Da sua originalidade, mas minhas filhas, a diferença é que eu nunca recebi dinheiro

Pelas fodas que dei, e o meu fascínio é outro, não por mel para as moscas,

Só me fascina a viagem que me proporcionais na distância entre o passeio e o interior,

Há uns poucos anos, eu a caminhar do outro lado, na canícula, sem medo, movido

Pela esperança de uma gazela à janela e só a música vinda da sua janela me fazia

Sair à noite, beber três chás gelados só para a ver a rir com outros,

Ela, que me convidou uma tarde, os meus pais não vão estar em casa

E não vou ir às piscinas, eu sentado do outro lado do sofá com ela à espera

Sentada quase deitada (“how to read a person like a book” – demasiado tarde)

Até que se cansou e me levou pela mão ao quarto para ouvir música (Enrique Iglesias)

E eu de pé até não aguentar o sem saber o que fazer e inventar uma razão para me arrepender

Pelo resto da tarde até ao resto da minha vida… é verdade, existe algo reprimido,

Mas agora a coisa vai, houvesse mais vontade que cinquenta euros não faltam

E ouvi dizer que tem que se lavar antes, quase ridículo quando provavelmente

Se vai saborear algum trolha de há uns minutos atrás, numa terra de mil e poucos

Onde se luta para se conseguir enviar cartas, onde se suicidam lentamente

Nas noites de inverno, onde a geada tem pena das cervejas, do vinho e da aguardente

Dos calos nas mãos e do cabelo cheio de cimento, tinta e mulheres cansadas à lareira.

Eu e o meu vizinho rimo-nos enquanto esperamos paz para estarmos com

As nossas cervejas, sempre fiéis, uma atrás da outra, perceberão que não vale a pena,

Porque viemos ver um espectáculo bizarro, uma procissão de santos caídos

De olhar no chão assim que descem com a sua vergonha, sabe-se lá a razão.

Ando seco minhas putas, ando seco, as nórdicas falam menos e pagam com

O silêncio que é de ouro e nunca me atraiu a ideia de ter uma mulher a foder-me

Como um homem fode, sem ser no coração, por isso, três cervejas e fechar o bairro.



14.09.2011



Turku



João Bosco da Silva


É A Vida



Geralmente surge de uma dor como a fome ou uma abstinência obstinada por razões

Pouco saudáveis para a alma, menos saudáveis para o corpo e saudades de corpos vazios

Que constantemente nos chegam cheios de momentos e engolem-se como se

A luz não ameaçasse um dia fugir-nos dos olhos, mas a vida a chama de uma vela,

Curta, frágil e tantos são os ventos, todos nos sopram contra a vontade da altura.

Mas isto não tem que ser um poema triste, nem aquele último olhar que se negou,

Nem as “promessas” feitas nos suspiros quentes, nem uma mão de terra que se espalha

No ar antes de cair na despedida eterna de um amigo, nem o beijo dado a quem se ama

Depois de se ter fodido quem se desej(ou)a, com o cheiro de outra cor no cabelo,

Nem o avião que parte e leva no porão todos os momentos quentes que arrefecem

E se tornam em fotografias para as longas noites de Outono, enquanto se espera

Até à morte e só a dor perdura nos corações dos que perderam, mas a dor não é triste

É dor, permite a existência do prazer, dos primeiros olhares através dos invisíveis,

Das promessas que vivem na eternidade de um momento e só aí podem ser cumpridas,

O privilégio de ter um amigo e de o manter vivo no nosso corpo, a ilusão do amor

Ou o que for, alguém que nos espera no aeroporto com barba comprida e basta um olá,

As folhas que caem para que venham outras, outros poemas que não são tristes,

Triste é quem os lê e quem os lê é gente e gente é uma busca incessante pela felicidade: é a vida.



14.09.2011



Turku



João Bosco da Silva