quinta-feira, 13 de outubro de 2011


O Meu Cemitério: A Cidade



Não sei quem chama o abafador nas horas das cidades, as paredes bastam, cheias de solidões

E vazios que iludem os olhos apressados, mas nem uma cortina se move além das janelas,

Uma aranha talvez, faminta ou resignada ao canibalismo, as manhãs frias não encaixam

No ambiente metálico da cidade, nem os joelhos no peito dos transeuntes que agonizam,

Uma batida atrás da outra que quase já nem era, um quase desmaio a manter a vida em pé.

Todas as paredes, todos aqueles sorrisos, promessas de carne e ossos, sangue na sede

De sinceridade, o aroma dos sexos que se asfixiam e se tentam anular num orgasmo,

Todo o cansaço a escurecê-las, a derrubá-las, uma a uma, contra o joelho do abafador,

Que anda longe da aldeia que o viu matar, longe do tempo de outras ignorâncias, onde o amor

Tal como deus existe, cresce, entre a ignorância, estrume de impossíveis, o súbito silêncio

Depois da última moda do arraial, quando o peso no peito ainda se sentia como a vida

A avisar que está presente, agora grita, enterra fundo os joelhos, ergue as paredes

Até o horizonte se tornar a recordação de uma sombra, fascinada pela semelhança dos cheiros

Entre cadáveres, ruínas e fumos de amores consumidos pelo tempo e pela vontade violenta.

No fim, restam aquelas delinquências nas paredes, palavras algumas, hoje quase vazias

Longe dos olhos que lhes deram alma, um corpo seco, uma língua com o presente

No futuro de todas as outras, no dia em que o abafador vencer, as paredes se tornarem

Maiores que os sonhos, mais dolorosas que os desejos, quando a cidade se tornar uma

Pirâmide invertida, um vórtice de pedra que se escoa no buraco negro do coração.



13.10.2011



Turku



João Bosco da Silva