sábado, 17 de março de 2012



Durar A Vida


Durar, carne que sonha a vida de poucos, recordar, tudo o que não se é mais

E se arrasta como um amante abatido pelo destino, abrir Platão na noite

Quente e encontrar a madrugada enquanto uns nascem em cavernas,

Outros fecham cavernas dentro de si, outros só fome, outros da que se

Mata com pulsos cortados e fracos de benzodiazepinas cheios de ar,

Cansar, o mundo com o nosso tédio, engolir o esquecimento e acreditar

Que a amizade é uma eternidade do momento, como o amor

Enquanto o esperma seca e não seca, enterrar o ridículo com Nietzsche

E sonhar colapsos redentores na solidão de uma multidão de ovelhas

Obcecadas por símbolos, fascinadas pela sua ignorância que preenche

Todas as dúvidas, escrever, como se em cada palavra a salvação do mundo

Mais próxima, quando não passa da transcrição da entropia percebida

Pela carne, durar, sem outra razão a não ser acreditar, sem esperança,

Nos romances que nos leram para crescermos iludidos e felizes,

Para acabarmos mirrados desiludidos e tristes, mesmo debaixo de uma noite

Estrelada em Agosto, com o peso do firmamento a apontar-nos

A nossa mortalidade, nós também feitos da morte de estrelas, nesta pedra

Onde tudo dura, dura, ao Sol numa dança constante com a melancolia,

Abraçar, a perdição como a única certeza, querer apenas mais um dia

Para tentar fazer o último valer a pena, da mesma forma que os filósofos

Provam que os que morreram estavam errados, os outros o único

Inferno possível, quem não dura mais em Montparnasse, a consciência

De si mesmo a maior partida do universo a ele mesmo, pedaços de mim

Que se sentem a durar, durante o que é a minha eternidade, que se

Criam e destroem, onde nada se cria nem se destrói, chorar, porque os

Poentes nunca mais ao lado do seu perfume, ejacular, a explosão de

Uma super-nova, sentir que um nada adiado tem o poder de novos

Universos, dos que duram e dançam com a melancolia, dos que vivem

E dos que dizem que vivem e se procuram onde nunca estarão,

Porque desconhecem que a sua existência depende do fim.



17.03.2012



Turku



João Bosco da Silva