segunda-feira, 18 de março de 2013


Não Sei Para Que Me Morreste Porque É Inútil

para o meu avô,

Não sei para que me morreste, mas também nunca percebi a morte, ou a vida, para quê uma se
A outra está para reduzir tudo a nada, nem cinzas, e os ossos anónimos não fosse o nome sobre
O qual as lágrimas dos que ficaram a ser menos e cada vez menos, não sei para que me morreste,
A égua já deve estranhar a tua ausência, porque hoje não é Domingo e tu de gravata, deitado, a estas
Horas, sem teres bebido gota de vinho e quero acreditar que por isso tão sossegado, não sei onde
Irei depois da festa do Verão amanhecer, agora que a carroça ficará de pernas para o ar e a madeira
Desistirá e cederá todos os anos que aguentou, ao caruncho e os melões ficarão a apodrecer, a vinha
Morrerá de sede do teu suor e o teu vinho não voltará a encher aquela caneca que parecia ir ficar
Pela eternidade fora em cima da lareira, do teu lado pelas noites frias fora, dos rigorosos Invernos
Da terra esquecida pelo país a que dizem que pertence, não sei para que me morreste, mas desculpa
Contrariar-te e roubar um pouco de ti que guardarei até eu morrer para os outros, podes fechar os
Olhos, podes não voltar a contar-me com orgulho a história do jogo da sardinha, que fui eu
Que escrevi nos teus olhos que não sabiam ler, junto à mesma lareira, podes não voltar a fazer batota
Na bisca dos nove, podes esquecer-te de mim, obrigado, eu sei como funcionam as sinapses e é
Na sua união que vive a alma, podes morrer-me, mas prometo-te e que me desculpe a morte,
Que os raios partam, que nunca te deixarei morrer de todo, não enquanto nas minhas veias correr
O teu sangue, não enquanto o dia me permitir acordar e ter saudades tuas, sentado debaixo daquela
Macieira, enquanto as vacas pastavam, com um pedaço de cortiça e uma faca nas mãos,
Com o teu ar de eternidade, as tuas mãos de raíz de castanheiro e cepa e da cortiça dois
Bois e eu convencido que era o neto de um deus real, por isso perdoo o teu coração humano, cansado
Pelos anos, calejado pelos dias, não sei para que me morreste, porque é inútil, nunca me morrerás.

Turku

02.03.2013

João Bosco da Silva

A Madrugada É Material Mutagénico

Um deus espirra uma incerteza e nasce um poeta, cheio de vazios e outros desvios
Que levam a lado nenhum, onde o mais profundo da alma se encontra com as chamas
Embriões de infernos como os de Dantes e os de agora, que são os mais reais,
Mais que a vizinha do andar de cima a aspirar o leite de mais um achado no bar da esquina,
Que só se imagina como será, um dia um encontro no elevador e o hálito a desconhecido,
Seria mais certa a canonizacão de Chuck Norris que acender mais uma fogueirinha no Vaticano,
Chega de queimar bruxas para cobrir múmias de poderes invisíveis, tanto desperdício
Onde não há carne e a carne tão vazia, pede uma e outra, todas as esferinhas tailandesas
A tornarem-se versos, numa desfermentacão de vinho para uvas, umas gota de água benta
Na cara em forma de ejaculação acumulada pelas obrigações tântricas pelas semanas
Das semanas, até à libertação das DSTs pelo corredor de merda dentro, como uma benção
Irónica, ou uma maldição bem intencionada, dá-me um beijo, pede depois do espirro
E a sua boca ainda adstringente onde futuros se sacrificam pela excitação da humilhação,
Quem diz deus, diz deusa e é indiferente qual o espasmo que expele, às vezes vomita
E mais um poeta, daqueles que passa a vida a digerir-se em versos para meter nojo ao mundo
Que já por si repugna, espera o último autocarro, pode ser que já não haja luz naquela janela.

10.03.2013

Turku

João Bosco da Silva